A física e o gol de Maradona

Foi um gol inacreditável. Certamente um dos mais bonitos de todas as Copas. Diego Armando Maradona disparou de seu campo carregando a bola nos pés, foi driblando os ingleses que se colocavam à sua frente tentando evitar a arrancada.

Um a um os marcadores foram superados. Maradona marcou o gol em Peter Shilton e lavou a alma ferida dos argentinos que ainda choravam os mortos na Guerra das Malvinas contra aquela mesma Inglaterra.

O jogo era válido pelas quartas de final da Copa do Mundo do México em 1986. A Argentina venceu a Inglaterra por 2 a 1 com dois gols do camisa dez, o primeiro em que enganou o goleiro Shilton com um toque de mão e o segundo, o golaço em que driblou seis marcadores. Lineker descontou para os ingleses.

O físico Marcos Duarte destrinchou a jogada do segundo gol usando a tecnologia de hoje. E o primeiro fato que a análise revela é o enorme trecho atravessado com a bola no pé.

“Um jogador do estilo Maradona, Zico, acima da média, eles são mais visados. Sempre tem alguém em cima e outro na sobra. Então é muito difícil um cara desses pegar a bola e percorrer dez metros”, conta Duarte.

Maradona percorreu muito mais de dez metros. No total, ele correu 55 metros na arrancada, praticamente metade da distância média que os jogadores percorrem com a bola em um jogo inteiro, e ele fez isso em apenas um lance. Para carregar a bola por tanto tempo sem ser desarmado, Maradona utilizou a velocidade e agilidade que muitos achavam que o rechonchudo Diego não teria. Ledo engano. No lance, o craque cumpriu os 55 metros em sete segundos a uma incrível velocidade média de 29 km/h.

Nessa distância, um bom velocista do atletismo profissional alcança a média de 35 km/h. Só que Maradona não fez uma corrida em linha reta sem distrações como os atletas na pista. Ele estava conduzindo a bola e driblando seis ingleses, e a cada toque a velocidade desaba. É como pisar no freio. Diego deu onze toques na bola, são onze freadas e mesmo assim ele não foi alcançado.

“Isso mostra duas coisas claras: o arranque, a velocidade que ele tinha e também sua habilidade”, explica o físico.

Veja abaixo o gráfico mostrando a distância percorrida por Maradona no gol contra a Inglaterra:

Esquema ilustrativo do gol de Maradona.

Gráfico mostrando a distância percorrida por Maradona no gol contra a Inglaterra (Fonte: Reprodução TV Globo)

A habilidade fica ainda mais evidente na forma como o jogador, então no Napoli, conduziu a bola sempre próxima ao corpo. No início da jogada, ela ficou no máximo a dois metros de distância dos pés dele. E do momento em que invadiu o campo adversário até o chute para o gol, “El Pibe” não deixou a bola fugir nem um metro de seu corpo.

“O pé que estiver mais próximo é o que terá mais chance de pegar essa bola. Quanto mais eu mantiver a bola próximo de mim, mais ela vai estar distante do zagueiro e menor a chance do defensor pegar a bola. Tem uma sintonia, uma mágica aí”, explica Marcos Duarte.

O camisa dez do Internacional, o argentino D’Alessandro, era na época um garoto de cinco anos, que lembra da façanha do conterrâneo.

Acho que foi um dos melhores de todos os tempos em Copas. Lembro de muita gente na rua, depois daquele jogo. O cara estava marcado pelo destino. O destino dele era fazer o gol contra a Inglaterra naquele jogo. Para nós, argentinos, foi uma coisa de outro planeta“, conta o argentino D’Alessandro.

Quem também lembra bem do momento é o ex-atacante da Seleção Brasileira naquela Copa. Casagrande fez parte do grupo que venceu quatro jogos e foi eliminado pela França nas quartas de final. Chateado com a derrota nos pênaltis, Casão no dia seguinte lembra bem da partida entre argentinos e ingleses.

Eu queria ver o Maradona jogar, ele estava arrebentando naquela Copa. Quando eu vi aquele gol, eu fiquei de bobeira, não acreditava. Numa Copa do mundo, o cara ter aquela frieza, aquela tranquilidade, de arriscar, vou partir daqui para o gol. É sensacional”, diz Casagrande.


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