Recursos hídricos no século XXI: gestão para a sustentação da vida

Livro dos professores Tundisi oferece soluções para a construção da gestão dos recursos hídricos voltada ao desenvolvimento sustentável e para uma nova ética no uso da água

Com o crescente problema de escassez e contaminação, a preocupação com o manejo sustentável da água ganha cada vez mais relevância em todo o mundo. Estimativas da ONU apontam que até o ano de 2025 o número de pessoas que vivem em países submetidos a grande pressão sobre os recursos hídricos passará dos cerca de 700 milhões atuais para mais de 3 bilhões. Fatores ambientais, econômicos, sociais e gerenciais contribuem para a crise dos recursos hídricos, de abrangência mundial.

Como quebrar paradigmas, planejar e gerir os recursos hídricos? Como evitar a deterioração dos suprimentos de água?

Para os professores José Galizia Tundisi e Takako Matsumura-Tundisi, pesquisadores e autores de Recursos hídricos no século XXI, é preciso descentralizar e integrar a gestão com o objetivo de dar consistência e apoio à gestão das bacias. Para eles, monitoramento permanente e participação popular são algumas das ferramentas para a gestão dos recursos hídricos.

Em entrevista exclusiva ao Comunitexto, José Galizia Tundisi fala sobre suas ideias e sobre questões polêmicas, tais como a usina de Belo Monte e a transposição do Rio São Francisco.

Foto do Rio São Francisco, cujo projeto de integração é parte de uma gestão dos recursos hídricos mais consciente.

Projeto de integração do Rio São Francisco em 2011 (Fonte: Projeto de Aceleração do Crescimento)

Comunitexto (CT): Qual a maior ameaça aos recursos hídricos atualmente?

José Galizia Tundisi (JGT): Existem várias ameaças aos recursos hídricos, as principais sendo: degradação de bacias hidrográficas; degradação da qualidade da água por vários fatores, como a falta de tratamento de esgotos; despejos industriais e metais tóxicos. Desmatamento é outra causa que afeta a quantidade e a qualidade da água.

CT: Quais são as novas oportunidades na gestão de recursos hídricos no Brasil?

JGT: Gestão por sub-bacias, gestão de grandes bacias (São Francisco, Rio Grande, Rio Tietê), monitoramento e capacitação de gestores.

CT: Quais foram os avanços na legislação dos recursos hídricos?

JGT: Nos últimos anos, tivemos a adoção da gestão por bacia hidrográfica, os Planos Nacional e Estadual de Recursos Hídricos, a implementação da Agência Nacional das Águas e a implantação da Portaria MS nº 518 do Ministério da Saúde, que torna obrigatórias análises periódicas da qualidade das águas de abastecimento antes do tratamento.

CT: A Política Nacional de Recursos Hídricos é avançada em relação a outros países?

JGT: A Política Nacional de Recursos Hídricos e a legislação brasileira são bem avançadas e estão entre as melhores do mundo. O problema é a implantação, que é mais lenta do que o necessário.

CT: Diante da polêmica com relação a Belo Monte, qual a sua opinião? O impacto ambiental terá proporções catastróficas ou os benefícios sociais serão maiores?

JGT: O impacto de Belo Monte será minimizado pelas compensações, pelo saneamento da região, pelas oportunidades de emprego e pela oportunidade de gerar energia que será benéfica para o Brasil e para a região. Haverá benefícios sociais. O impacto da obra não será catastrófico de forma alguma, e a gestão futura deve, sem dúvida, preservar esses impactos.

CT: E com relação à transposição do Rio São Francisco? Quais serão as consequências?

JGT: A transposição do São Francisco poderá ser uma obra exemplar se houver: gestão das microbaciastratamento dos esgotos dos municípios da área da transposição; revitalização do Rio São Francisco (da bacia) e capacitação de gestores e técnicos. Se tais medidas não forem tomadas durante a obra, o impacto e a transposição serão um desastre completo.

CT: Em carta publicada na revista Veja, o senhor diz que “Com matas ciliares e várzeas reduzidas, a agricultura terá pouca água, que é sua matéria-prima fundamental. Para que a regulamentação da lei seja efetiva e adequada, é preciso que se utilize a informação científica existente no Brasil, que é de excelente nível”. O que o Código Florestal brasileiro de 2012 (texto proposto por Aldo Rebelo, PCdoB-SP) significa para a gestão dos recursos hídricos no Brasil?

JGT: O novo Código Florestal do Brasil, como está proposto, é uma ameaça aos recursos hídricos. A redução das matas ciliares e a remoção das várzeas reduzem a quantidade e qualidade da água, e aumentam a escassez. A gestão de recursos hídricos será pontilhada de conflitos locais e regionais entre a demanda de água para a agricultura e o abastecimento.

Deve-se discutir um novo Código Florestal utilizando-se das seguintes premissas: a proteção das várzeas, das matas ciliares e dos mosaicos de vegetação é fundamental para a manutenção do ciclo da água (quantidade) e da qualidade da água; o aumento da produção agrícola deve ser realizado às custas de uma maior eficiência de produção, e não às custas da redução de florestas e várzeas; a biodiversidade nos mosaicos de vegetação afetará o controle natural das pragas que afetam a agricultura.


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